Ao vivo, Melingo, voz marcada pela vida, é um portento de alma e emoção, que consegue incorporar o lado maldito do rock de Nick Cave e da chanson de Serge Gainsbourg na criação elevada por Gardel até à condição de banda sonora por excelência das vielas de Buenos Aires. Em Paris, Melingo ainda aprendeu algo do cabaret que faz com que a sua música soe melhor com luzes baixas e um copo na mesa em frente a nós. As suas canções pegam no tango e retorcem-no, sem nunca o descaracterizar. Melingo soa perfeito por cima de bandoneon e baixo, por cima de trombone ou guitarra. Ao vivo, é um actor possuído que vive as histórias negras de que falam as canções. No britânico Guardian afirmou-se que «a extravagante teatralidade dos seus concertos irá conduzir Melingo ao sucesso internacional.» Sem dúvida.
A editora Mañana foi criada por Eduardo Makaroff dos Gotan Project para explorar a nova vitalidade do tango e a sua primeira aposta recaiu, precisamente, sobre Daniel Melingo. Melingo, como já se escreveu, é o seu próprio mito: foi estrela dos palcos rock alternativos da Argentina na década de 80, ajudou a inventar a movida de Madrid, e estudou todos os mestres, de Gainsbourg a Nick Cave, de Tom Waits à lenda do tango El Polaco. Em 2005 Melingo editou o aplaudido «Santa Milonga» e imediatamente estabeleceu uma imagem reinventada, já longe do rock, embora ainda perfeitamente rebelde. Com o segundo álbum, «Maldito Tango», a transformação completou-se e Melingo surgiu como uma alma danada, fugida das imagens clássicas do tango para pegar no legado de Gardel e reinventá-lo, com teatro, com alma, com estilo. A propósito de uma passagem sua pelo Royal Festival Hall, em Londres, escreveu-se no Guardian que Melingo tem em «Maldito Tango» um excelente álbum, mas que ainda assim não nos prepara para a pura electricidade da sua performance.
Melingo já passou por Portugal algumas vezes, quer para concertos em nome próprio, quer para colaborar em concertos de Rodrigo Leão com quem colabora no álbum “A Mãe” com o tema “No Sè Nada”.
Regressou há pouco com o álbum “Anda”, apresentado como um delírio saído de uma novela de Borges, em que Melingo surge como uma espécie de ilusionista. Este trabalho é também descrito como um filme de Fellini que se vê de olhos fechados e ouvidos bem abertos. Referências mais do que certeiras que posicionam o novo trabalho de Melingo entre o realismo e a fantasia, feito de palavras e imagens fortes e de uma música absolutamente singular onde ao tango se juntam referências de Serge Gainsbourg a Erik Satie. Sinal claro dse que o universo deste incrível criador argentino continua em expansão e cada vez mais refinado.